O engenheiro eletricista catarinense Ênio Padilha, articulista e professor, escreveu, em 2002, um brilhante artigo sobre esse tema. Voltamos a ele, que continua, ainda hoje, recorrente e atual.
Como sempre, os artigos do engenheiro Ênio Padilha são recheados de experiência e sabedoria. Ele começou a escrever a série “Por que odiamos tanto o Crea?”, em 2002.
É incrível, mas entre o ano atual, final de 2021, e aquele do primeiro artigo, 2002, já se passaram 19 anos. Nesse espaço de tempo uma criança nasce, cresce, desenvolve- se, estuda, toma decisões, muitas delas trabalham e ralam para sobreviver e a maioria já está enfrentando um curso superior com todas as dificuldades inerentes à vida.
Algumas coisas, porém, permanecem imutáveis nesta nossa vida: uma delas é o ódio ao Sistema Confea/Crea. Não o ódio à instituição, mas ao comportamento das pessoas que dele se apoderaram. E isto, é bem verdade, não começou em 2002. É de muito antes. Explico os motivos.
Já tive oportunidade de dizer, em diversas ocasiões, que, se o Sistema Confea/Crea fosse um conglomerado de empresas privadas, ele não sobreviveria a uma semana, pois, embora tenham os mesmos objetivos, as
ações entre elas não comungam dos mesmos interesses. Mas, ao contrário das empresas privadas, esses órgãos
estão abarrotados de dinheiro. E de funcionários públicos, que, no Brasil, são conhecidos mais pela alcunha de aspones. E tem aspone para todos os gostos.
Tanto o Confea quanto os Creas se envolveram, excessivamente, em questões políticas, muito fora dos propósitos e princípios para os quais foram criados. Sem compromissos claros com a comunidade profissional, pouco evoluíram ao longo dos últimos 88 – oitenta e oito! – anos, muito embora tenham passado por eles grandes nomes que devemos respeitar.
O chamado Sistema Confea/Crea, por sinal, é o retrato vivo da falência de um modelo administrativo. De hámuito fazemos parte do custo Brasil, que é quando um órgão público se torna um entrave burocrático, capaz de só produzir despesas. Esta é a nossa dura realidade.
Há uma falsa premissa entre muitos dos atuais integrantes, que vivem a repetir que o Sistema atua em defesa da sociedade. Ora, por acaso existe algum órgão público que não atue em defesa da sociedade? É óbvio que não!
Nesse quesito, por sinal, o que precisamos mesmo não é de um órgão público, mas de bons profissionais que atendam de forma ética e com competência a toda a sociedade, que não espera menos que isto de todos nós.
Contudo, estamos à míngua desses profissionais, pois nossos engenheiros estão, há muitos e muitos anos, alijados de um processo de formação técnica aceitável, pois nossos cursos técnicos passaram a fazer parte de um mercantilismo exacerbado, que muito nos tem prejudicado.
Cabe aqui uma pergunta: que retorno os profissionais do Sistema obtêm com o pagamento compulsório e de vulto das anotações de responsabilidade técnica e das anuidades? E dos exorbitantes valores cobrados a título de taxa de serviços? Será que não podemos buscar uma alternativa mais justa, racional e equilibrada de cobrança de taxas e emolumentos?
A resposta para isto é sempre a mesma: não temos nenhum retorno. Somos esbulhados o tempo todo.
Apesar do avanço da tecnologia e da informatização, o Confea e os Creas são vistos meramente como órgãos arrecadadores e ineficientes, responsáveis por mais um dos muitos componentes do chamado custo Brasil.
Longe, muito longe estão, das verdadeiras necessidades dos profissionais e da sociedade.
É isto que causa o ódio que nutrimos pelo Sistema.
É lamentável, por exemplo, que o Confea e os Creas sequer sejam consultados para opinar sobre os grandes desastres que, ano após ano, chocam a nação brasileira.
Vidas humanas e de animais, encostas, rios, lagos,nascentes, mananciais, árvores e plantações, casas, móveis e veículos: tudo é destruído. Mas não somoschamados a opinar, mesmo que esses infaustos acontecimentos estejam dentro da nossa área de atuação.
O Sistema Confea/Crea, pois, tem que dar um salto qualitativo e positivo rumo ao futuro. Esse provecto senhor de 88 anos não pode mais viver nesse mundo de faz de conta em que vive, sob pena do ódio a ele crescer, e com razão, cada vez mais.